terça-feira, 19 de outubro de 2010

Santos e Estandartes: diálogos entre erudito e popular


Por Hélio Siqueira - artista plástico

Altar Madre y Niño
Mário de Andrade, no encerramento do curso do Instituto de Arte no Rio de Janeiro, afirmou: “Devo confessar preliminarmente, que eu não sei o que é belo e nem sei o que é arte”, deixando o público completamente atônito. Este fato aconteceu em 1938. Dürer também, disse, nos idos renascentistas: “não sei o que é beleza, ainda que ela se encontre em muitas coisas”. O crítico Frederico de Morais, recentemente lançou um livro e deu o sugestivo título, “arte é o que eu e você chamamos arte”. Pensando bem, porque, então, estou aqui, tentando decifrar um assunto tão difícil? Tão polêmico? Pensadores, críticos, artistas, poetas, filósofos já se debateram sobre ele emitindo, as mais contraditórias definições. Uns decretando solenemente que a arte acabou e outros bradando mais forte ainda, que ela está morta e enterrada. Será que meu bom senso não consegue perceber isto? Respondo esta pergunta com um sonoro - Não! Eu a sinto forte. Viva. Pulsante. Incandescente. Nas paredes dos museus, nas galerias públicas ou particulares, nos centros culturais que vejo e visito e ainda acontecendo silenciosamente, solenemente no interior de um atelier. Minha experiência nesta área me leva a dizer que a arte existe. Ela se manifesta das mais diferentes formas e nos mais diferentes espaços, dependendo apenas dos estímulos suscitados pela cultura de cada povo. Quarenta mil anos se passaram do paleolítico aos nossos dias, e, no entanto, apesar de todas as previsões contrárias dos visionários desastrados, a arte esta aí, cada dia mais viva, mais envolvente, mais complexa, para aguçar o nosso olhar, para o deleite de nosso espírito, para nos fazer pensar.
Sempre existiu uma briga ferrenha e acirrada entre os teóricos que tentam lançar luzes e traçar limites entre arte erudita e arte popular. Mais nos confundem do que esclarecem. Uns dizem que arte popular é arte menor. Eu digo, nestes quarenta e cinco anos de carreira, que encontrei na arte popular, a verdade primeira do artista que se expressa de forma lúdica, verdadeira e sem preconceito. Na arte popular o artista, com todas as suas vivências, coloca no abjeto, o seu gosto estético, de primeira mão para enfeitar o mundo e não querendo, de forma nenhuma, ser imediatamente consumido. A finalidade da obra é estética. Na arte erudita o artista não é só um intuitivo. Ele estuda. Cria, recria, inventa, reinventa, renova, vela e revela e nunca esconde em suas pesquisas, as verdades que vai buscar na arte popular para alimento do seu trabalho. Ele desconstrói para reconstruir o seu universo.
A exposição “Santos e Estandartes” procura abrir e estabelecer um diálogo franco entre as duas vertentes, discutindo a arte hoje e perguntando: Onde acaba o popular e começa o erudito? A mostra não fecha esta questão de imediato. Ela conta com a participação do público, que com suas argumentações plurais e olhares múltiplos, complementará os diálogos que os trabalhos solicitam.
Popular/erudito, coloca todos os artistas no mesmo patamar de intelectualidade. São mundos que dialogam e se completam.  A mostra propõe transcender as categorias de arte erudita e arte popular, reconhecendo e evidenciando os diálogos suscitados entre e por elas. Mostrar como as duas culturas se mesclam, se esclarecem, se confundem e se alimentam num processo permanentemente dinâmico de recriação de significados. “Santos e Estandartes” – expressa com poesia e clareza, a trama multifacetada que constitui a diversidade e a força da cultura brasileira e renova a idéia de que a arte é viva, latente e que jamais se apagará.

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